Campo Grande (MS) – O artesanato com linhas como um meio de transformar vidas. Assim é um trabalho desenvolvido na Penitenciária de Dois Irmãos do Buriti (PDIB) que, além de garantir ocupação produtiva, contribui com a rotina de disciplina e traz uma nova perspectiva para os recuperandos, pois serve para que eles desenvolvam a criatividade e talentos, ou mesmo aprendam uma profissão.
O conhecimento é passado de um para o outro e, somando-se às revistas instrutivas e a força de vontade, criam-se peças únicas e carregadas de sonhos e perspectivas. A qualidade é tamanha que a penitenciária ganhou um espaço na Feira Livre do Município, que acontece sempre no primeiro e terceiro sábados de cada mês. A partir de outubro, haverá uma barraca exclusiva para a divulgação e venda das peças, cedida pela Secretaria Municipal de Ação Social.
O diretor da PDIB, Paulo Inverso Elias, destaca que a exposição é uma maneira de envolver a comunidade em iniciativas que visam à ressocialização. “É importante que a população desmistifique essa ideia de que o presídio seja só um local onde fica um monte de criminosos, é preciso enxergar que existem pessoas que estão tentando realmente mudar de vida”, enfatiza. “Queremos que a sociedade seja nossa parceira na busca pela reinserção social de nossos custodiados. Estamos buscando mais parcerias, quebrando barreiras”, completa.
De acordo com o chefe de Segurança e Vigilância do presídio, Silvânio Queiroz da Silva, 25 internos trabalham com artesanato e, além do retorno financeiro, conforme o preço de cada peça, recebem remição de um dia na pena para cada três trabalhados. A produção concentra-se principalmente na confecção em crochê, como tapetes, tolhas de mesa e colchas, além de pesos de portas e “porta-trecos”, umas principais especialidades deles.
Flávio Garcia Júnior, 43 anos, é um dos que trabalham com artesanato no local. Natural de São Paulo, o reeducando foi preso em 2013 na cidade Ponta Porã por tráfico de entorpecentes, quando atuava como caminhoneiro. Custodiado na PDIB desde então, descobriu na arte de trabalhos manuais com linhas e agulhas uma opção para ocupar a mente, remir pena e garantir recursos financeiros, que ele assegura estar utilizando para cobrir pequenos gastos pessoais, já que quase não recebe assistência da família, bem como para fazer uma poupança para quando deixar a prisão e, assim, poder construir uma nova história de vida.
O talento para confeccionar peças únicas, segundo o detento, veio da mãe, mas foi na unidade prisional que ele aprendeu todas as técnicas que poderão servir como uma fonte de renda também quando conquistar a liberdade. “Em dezembro minha mãe veio me visitar e levou para São Paulo algumas coisas que fiz, ela ficou encantada, e isso me deixou muito feliz. Acredito que, se não for minha profissão principal, posso fazer artesanato para complementar meus ganhos”, comenta.
O exemplo da Penitenciária de Dois Irmão do Buriti também é realidade em outros estabelecimentos penais Estado, conforme o diretor-presidente da Agência Estadual de Administração do Sistema Penitenciário (Agepen), Ailton Stropa Garcia. Além preocupação em expor e dar vazão às peças artesanais produzidas nos presídios, destaca Stropa, a instituição tem investido em parcerias que qualifiquem os reeducandos e reeducandas para que possam desenvolver trabalhos de qualidade e, assim, conquistarem mais espaço no mercado.
Entre as ações desenvolvidas pela Agepen este ano na área está a parceria com a Secretaria de Estado de Cultura, Turismo Empreendedorismo e Inovação (Sectei) para fornecer a “Carteira Profissional de Artesão” aos custodiados do Estado que trabalham na área. Também foi cedido pela secretaria um espaço na Casa do Artesão em Campo Grande, além de o Sistema Penitenciário ter conquistado uma tenda para exposição e venda de peças artesanais no Festival América do Sul, evento realizado de 20 a 22 de agosto, em Corumbá, e que reuniu turistas de várias partes do Brasil e do mundo.
Dados da Diretoria de Assistência Penitenciária da Agepen, por meio da sua Divisão de Trabalho, apontam que atualmente cerca de 400 reeducandos estão cadastrados para realizarem trabalhos artesanais em presídios do Mato Grosso do Sul.