Campo Grande (MS) – A arte como meio de transformar vidas resume os sentimentos expressados na abertura da 9ª Feira Artesão Livre – Especial de Natal, na tarde desta quinta-feira (13.12), no Fórum de Campo Grande, que, além das belas peças artesanais confeccionadas em presídios de Mato Grosso do Sul, apresentou ao público presente exemplos reais de como projetos desenvolvidos pela Agência Estadual de Administração do Sistema Penitenciário (Agepen) podem fazer a diferença na vida de pessoas que até então haviam escolhido o crime como opção e hoje buscam escrever uma nova história.
O depoimento do ex-custodiado do Presídio de Trânsito (PTRAN), Everton Quinhones Ribeiro, que atualmente é monitorado por tornozeleira, emocionou a todos os presentes, ao revelar que encontrou no talento para o artesanato, e na oportunidade dada quando ainda estava na unidade penal, a certeza de querer construir um caminho diferente.
“No presídio, percebi que a arte pode transformar uma pessoa, a cada elogio que recebia, a cada peça que vendia”, declarou. “Hoje sou conhecido como Mutuca Artes, mutuca é um apelido de infância e artes porque eu desenvolvo muitas artes, faço tatuagem, grafite aerografia, customização, móveis rústicos e artesanato hippie, entre outros”, disse.
O artesão destacou que, já na rua, venceu um campeonato de aerografia em carro. “Quando saí do presídio falei para os que ficaram que eles iriam me ver na televisão, mas não nos programas policiais, e sim pelo reconhecimento da minha arte. Agora estou aqui segurando este troféu, que é uma pequena demonstração do que sou capaz, estou construindo meu nome, e ainda tenho muito a conquistar”, disse, arrancando aplausos da plateia.
Conforme Everton, sua meta é multiplicar o sabe ensinando crianças, para que elas não cometam o mesmo erro que ele de entrar para a criminalidade. “Vou usar este talento para, no início de 2019, ensinar minha arte na Associação Ribeiro de Karatê, na Vila Nogueira”, informou.
Arte pela Música
As várias formas de expressar arte e como sistema prisional do Estado a utiliza para proporcionar a reinserção social também foi materializada na apresentação da “Banda Ressocializando”, formada por detentos do Centro de Triagem, que deixaram o presídio para fazer uma apresentação especial ao
público durante a abertura do evento.
O grupo existe desde 2015, e surgiu a partir de um projeto em que um interno que ensinava outros reeducandos a tocarem bateria. O sucesso da iniciativa possibilitou a conquista de outros instrumentos, doados por instituições religiosas parceiras.
“Agradecemos a todos que deram uma força para a gente chegar até aqui, é muito bom ouvir os aplausos e sermos tão bem recebidos, tocar e cantar para vocês foi um prazer e, com certeza, fará muita diferença em nossas vidas”, declarou o custodiado Manoel Martins Filho, nomeado pelos companheiros como líder da banda.
Artesão Livre
Realizada desde 2014, a Feira Artesão Livre tem como objetivo expor à população trabalhos desenvolvidos pelos detentos nas unidades prisionais, possibilitando a profissionalização na área de artesanato; comercialização das peças e geração de renda para pessoas em situação de privação de liberdade.
A exposição é um sucesso consolidado e acontece por meio de parceria entre a agência penitenciária, Ministério Público Estadual, Poder Judiciário e o Conselho da Comunidade de Campo Grande.
Este ano, reúne cerca de 800 peças produzidas com mão de obra prisional de oito presídios de Campo Grande, Aquidauana e Dois Irmãos do Buriti. São tapetes, esculturas, telas, móveis, luminárias, entre outros.
Nesta edição, a Feira de Natal apresenta também trabalhos artesanais desenvolvidos por custodiados da Agepen que recebem tratamento psiquiátrico. As criações fazem parte do projeto Um Olhar Além das Grades, que é promovido pelo Módulo de Saúde. Com o uso da arte-terapia, a iniciativa objetiva facilitar a resolução de conflitos, a busca pelo autoconhecimento e o desenvolvimento da personalidade.
Para o diretor-presidente da Agepen, Aud de Oliveira Chaves, a concretização da feira é a demonstração do empenho dos agentes penitenciários que não medem esforços para que projetos de recuperação do indivíduo se concretizem. O dirigente enfatizou, ainda, a importância das parcerias, como as estabelecidas com o Judiciário e Ministério Púbico, para que o sistema prisional possa cumprir sua missão de tirar das unidades penais pessoas melhores, promovendo a efetiva ressocialização.
A promotora de Justiça Renata Ruth Goya, uma das principais incentivadoras da Feira, reforçou a importância de se possibilitar ocupação à mão de obra prisional e também enfatizou a união de esforços para que projetos saiam do papel. “São pequenas gotas de água que, juntas, se transformam em um oceano, e nos possibilitam vivenciar momentos como este de transformação de vidas”, parabenizou.
Também participaram da solenidade de abertura o juiz diretor do Fórum de Campo Grande, Ariovaldo Nantes; o juiz da 2ª Vara de Execução penal, Mário José Esbalqueiro; a presidente do Conselho da Comunidade de Campo Grande, promotora Regina Dornte Brock; a promotora Paula Volpi; e o vereador André Salineiro,vice presidente da APAC; além de chefias de áreas e diretores de unidades da Agepen.
A primeira etapa da 9ª Feira Artesão Livre – Especial de Natal foi realizada nos dias 10 e 11, no Centro Integrado de Justiça (Cijus). No Fórum, ela prossegue até esta sexta-feira, dia 14 de dezembro, no horário de funcionamento do local.
Texto: Keila Oliveira
Fotos: Tatyane Santinoni.